Olá!
Me chamo Priscila Pyrrho, tenho
35 anos, e sou Ginecologista e Obstetra por vocação e por paixão. Tenho um
casal de filhos de 7 a 5 anos, e ser mãe foi fundamental para que eu me
envolvesse ainda mais com o universo da maternidade e compreendesse, na pele, toda
a ansiedade e a insegurança que surgem junto com esse período. Ultimamente
parece que ser mãe está ficando cada vez mais difícil! Cada hora surgem mais
motivos para dilemas e preocupações: é a amamentação, a mamadeira, a chupeta, a
papinha, o agrotóxico, a creche, a babá, a volta ao trabalho, é isso, é aquilo
outro... ufa! Cansa só de pensar!
E em meio a tudo isso, surge mais
um motivo de polêmica e preocupação: a Zika.
A Zika é uma doença causada por um vírus, e que é
transmitido pelo mosquito Aedes aegypti.
Muita informação confusa, sem
embasamento, muitos boatos e polêmica tem envolvido a Zika e o surto de
microcefalia recente no Brasil. Já ouvi pessoas afirmando que a microcefalia
nada teria a ver com a Zika, mas sim com o estado de anemia severa da população
do nordeste. Também já ouvi pessoas dizendo que tudo isso estaria sendo causado
por um lote de vacinas vencidas e que o governo estaria omitindo informações
sobre isso. Outros já me questionaram como teriam descoberto relação entre a
Zika e a microcefalia só agora, se é uma doença que já existia em outros países
anteriormente.
Pra responder essas questões vou
ter que voltar um pouquinho no tempo...
Foi na Floresta Zika, em Uganda,
em 1947, que se isolou pela 1ª vez o vírus da Zika em macacos, durante monitoramento
da febre amarela. A primeira infecção humana foi notificada em 1952. Porém a
doença só tomou notoriedade internacional após um surto entre 2005 e 2007 na
Oceania, quando foi então verificado seu potencial endêmico, e em seguida o surgimento
de outros casos em outros lugares do mundo. Em fevereiro de 2015 o Ministério
da Saúde começou a receber um numero grande de casos de doença exantemática sem
causa definida, de evolução benigna e resolução espontânea, nos estado da
Bahia, Maranhão, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Sergipe e Paraíba. No final
de abril, pesquisadores da Universidade Federal da Bahia anunciaram a
identificação do vírus Zika. Depois disso, foi reconhecido a presença do vírus
em 18 federações do país (áreas escuras no mapa), e em julho de 2015, foi
comprovada a primeira síndrome neurológica relacionada ao vírus.
É impossível conhecer o número
real de infectados pelo vírus Zika, pois é uma doença onde cerca de 80% dos
infectados não apresentam sintoma algum, e grande parte dos infectados não procura
nenhum serviço de saúde, dificultado ainda mais o conhecimento da magnitude da
doença. Além disso, não há, até o momento, exames de qualidade ou quantidade
suficientes para a confirmação da doença. Dessa forma, estima-se que, em 2015,
o numero de infectados no país deva estar entre 500 mil a 1 milhão e meio.
Em outubro de 2015, o estado de
Pernambuco solicitou apoio do Ministério da Saúde para investigar um surto de
microcefalia na região, e este fez uma notificação à Organização Mundial de
Saúde. Juntos com outros órgãos de investigação, aventou-se a hipótese de haver
correlação com a infecção pelo Zika vírus, e em novembro, foi lançado um
documento sobre o potencial de risco de microcefalia pós infecção pelo vírus.
No documento consta o caso da Polinésia Francesa (o tal caso da Oceania que falei antes) que,
também, teve um surto de microcefalia e malformações do sistema nervoso
central, coincidindo com um período de epidemia da doença. Diante do documento,
a Polinésia Francesa testou a sorologia específica em 4 mulheres cujos filhos
haviam apresentado alterações, e identificaram positivo para Zika. Dai começou todo o bafafá!
A partir daí, se iniciaram uma
série de testes e investigações clínicas, epidemiológicas e laboratoriais, que
conseguiram identificar o vírus no líquido amniótico de gestantes, no tecido
cerebral de fetos com microcefalia que evoluíram a óbito, e conseguiram
elaborar a relação da doença exantemática nas gestantes com o aparecimento de
alterações cerebrais no feto.
Dessa forma, ficou claro que o
vírus da Zika, é de fato o causador do aumento de casos de microcefalia e
lesões cerebrais atualmente identificados no país, e não por conta de vacinas
vencidas nem por causa da pobreza e desnutrição no nordeste.
Agora vamos às perguntas que sempre me fazem depois que
eu conto essa historia:
- Então é, realmente, perigoso
pegar Zika na gravidez!?
R.: SIM. O Vírus da Zika, tem um
tropismo, ou seja, uma preferência, pelo tecido do sistema nervoso, porém não
se pode afirmar que a presença da Zika na gravidez leva, invariavelmente, à
microcefalia. Assim como em outras infecções congênitas (ex: toxoplasmose,
citomegalovírus), o desenvolvimento das anomalias pode variar de acordo com a
carga viral, com a idade gestacional em que se teve a doença, com a imunidade
da gestante, e com outros fatores ainda desconhecidos até o momento. Mesmo em
fetos com o perímetro cefálico normal, já foram descritas outras alterações
cerebrais, como calcificações parenquimatosas, hipoplasia de cerebelo, agenesia
de vermis, ventriculomegalia, etc. Ou seja, não basta medir o tamanho da cabeça
dos bebês, é preciso avaliação cuidadosa de todo o cérebro, sempre que houver
suspeita da doença. Vale lembrar que a microcefalia relacionada à Zika é uma
doença nova e que está sendo descrita pela primeira vez na história, baseada no
que esta acontecendo no Brasil, então ainda restam muitas perguntas a serem
respondidas.
- Qual o período da gravidez de
maior risco pra gestante?
R.: Apesar do período embrionário
(até 8 semanas) ser considerado o de maior risco para múltiplas complicações,
sabe-se que o sistema nervoso central permanece suscetível a complicações
durante toda a gestação, e a gravidade do comprometimento dependerá de uma
série de fatores fetais e maternos. Tem-se cogitado também, a ocorrência de
outras alterações, não neurológicas, relacionadas à Zika, como catarata
congênita, cardite e aumento de timo, mas estas ainda necessitam de mais investigações.
- Existem outras causas de
microcefalia? O que ela pode causar no bebê?
R.: Sim. Ela pode ser genética,
pode ser causada por algum acidente vascular cerebral hemorrágico, pode ser por
conta de outras infecções como sífilis, toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus,
pode ser causada também por agentes externos como álcool, radiação ou diabetes
materna mal controlada, e ainda pode ser grave e crônica desnutrição. A
microcefalia pode causar epilepsia, paralisia cerebral, retardo no
desenvolvimento, problemas de visão e audição, e até a morte. Cada caso deve
ser avaliado e tratado, individualmente.
- É verdade que a Zika também
pode ser transmitida sexualmente, pela saliva e pelo leite?
R.: Já foi identificada a
presença do vírus na urina, leite materno, saliva e sêmen, porém não significa
que sejam importantes vias de transmissão, já que não foi observada a
replicação viral nesses meios.
- Existe tratamento pra Zika?
R.: Não existe tratamento
específico pra Zika. Recomenda-se o uso de sintomáticos como paracetamol e
dipirona para dor e febre, e no caso de erupções pruriginosas, o uso de
anti-histamínicos. Não de recomenda o uso de AAS e outros anti-inflamatórios,
em função do risco de complicações hemorrágicas.
- Como me prevenir?
R.: Evitando áreas de risco,
usando telas nas residências e repelentes. Para as gestantes são recomendados aqueles
que contém DEET-N, N-dietil-3-metatoluamida, e icaridina. A aplicação do
repelente deve ser feita sempre por último, ou seja, depois de maquiagem ou
protetor solar.
Bem, eu sei que foi muita informação e muita coisa técnica,
também! Mas acredito que, neste caso, não temos muito como fugir dos termos
usados na área medica. E, principalmente, espero ter ajudado a esclarecer
algumas duvidas que as pessoas vem tendo sobre a Zika.
Mas lembrem-se: antes de acreditar em qualquer informação
disponível na internet, pesquise a fonte para ter certeza de que é segura!
Esse texto que escrevi foi baseado no Protocolo de
Vigilância e Resposta à Ocorrência de Microcefalia Relacionada à Infecção pelo Vírus
Zika, do Plano Nacional de Enfrentamento à Microcefalia, 2015. Então, se vocês quiseram
checar a fonte, segue abaixo o link para acesso completo ao documento.
Agradeço à Renata pelo convite, pois gosto muito de poder
ajudar e orientar as pessoas e se alguém tiver alguma outra duvida, fiquem a
vontade para me enviar, através do blog ou da pagina do Playing Paradise no
FaceBook. Terei prazer em ajudar!
JUDO EDUCA
ResponderExcluirhttp://judojc.blogspot.com.br/