segunda-feira, 7 de março de 2016

Depressão Pos-parto! Parte IV - Porquê algumas mulheres desenvolvem depressão pós parto?


Como o Dr. Rodrigo Toledo bem disse, a maternidade é uma benção! Mas ao contrário do que se imagina, o período de gestação nem sempre é marcado por alegrias e realizações. Muitas mulheres experimentam tristeza ou ansiedade nessa fase de suas vidas. A literatura científica aponta para a gravidez e o pós parto, como as fases de maior prevalência de transtornos mentais na mulher, principalmente no primeiro e no terceiro trimestre de gestação, e nos primeiros 30 dias de puerpério. Esse quadro depressivo pode aparecer até cerca de 7 meses após o parto, podendo se estender por um período de aproximadamente de 2 anos.

Mas quais seriam os motivos para isso acontecer? Existem fatores de risco que possamos identificar com antecedência? As alterações hormonais que acontecem nessa fase poderiam explicar a alta incidência da doença?

Na literatura, vários estudos chegaram às mesmas conclusões, e os principais fatores de risco já estão muito bem estabelecidos. São eles: o baixo suporte familiar, gravidez não planejada/desejada, histórico de depressão ou transtorno psiquiátrico pessoal ou familiar, depressão durante a gravidez, complicações durante o parto, doença no bebê, características de personalidade, baixa autoestima, baixo nível socioeconômico, baixa escolaridade, obesidade, ansiedade e privação sono extremos.

Ou seja, o contexto social, familiar, e a sensação de realização pessoal e satisfação com relação à gravidez, o parto e a maternidade, são determinantes para o desenvolvimento de depressão pós parto.

Ok. Mas porque então, algumas mulheres que tiveram gestações planejadas, o parto desejado, e que a princípio não se enquadrariam nesses fatores de risco, também estão sofrem desse mal?
É fato que os hormônios exercem uma grande influência sobre o humor e as emoções, e que isso é, extremamente, relevante quando se fala de mulheres. O que sabemos hoje é que, algumas mulheres possuem uma sensibilidade particular às variações hormonais, e que já se manifestam desde o período menstrual. Um bom exemplo seria a tão conhecida TPM (tensão pré-menstrual), onde algumas delas se mostram mais irritadas e sensíveis do que outras, e que apresentam melhora considerável com uso de anticoncepcional contínuo, ou seja, quando essas variações são minimizadas.

Durante a gravidez, há um aumento significativo de vários hormônios como a progesterona, o beta-HCG, e o estrogênio que pode subir, por exemplo, em até 30 vezes. Essas alterações são importantes para que haja a manutenção da gravidez e para que ela transcorra de forma saudável, mas algumas mulheres já experimentam nessa fase, uma instabilidade emocional. Depois do parto, mais uma vez, ocorrem mudanças drásticas nos níveis hormonais. O estrogênio e a progesterona que estavam altos, caem subitamente, e, em contrapartida, outros hormônios aumentam, como a prolactina e a ocitocina. O que sabemos é que naquelas mulheres que já são suscetíveis a variações hormonais, esse “sobe e desce” hormonal pode ser um facilitador para o aparecimento de transtornos psíquicos.

É preciso ter em mente de que a gestação e o puerpério são períodos no qual a mulher passa pelas maiores transformações da sua vida, e que isso não se restringe apenas às variáveis hormonais e bioquímicas. Junto com o bebê, nasce também uma nova mãe, um novo pai, um irmão, avós, primos e tios... nascem novos papéis e com eles novas responsabilidades e novas relações... nascem preocupações, medos, inseguranças... nascem novas necessidades, demandas, ajustes e novos custos de vida. A intensidade com que essas alterações irão impactar na saúde psíquica, irá depender de fatores orgânicos, familiares, conjugais, sociais, culturais e da personalidade de cada gestante.

Enquanto médica, mulher e mãe, pude experimentar, na pele, o impacto dessas alterações depois do parto da minha primeira filha. E posso dizer que não foi nada fácil. Mesmo tendo sido uma gestação desejada, e apesar de todo o conhecimento que eu tinha, os primeiros meses do puerpério foram “trevas” pra mim.

Pra começar, eu não consegui sentir o tal “amor de mãe” que todo mundo fala que surge na hora que vc olha pro seu filho pela primeira vez. Aliás, ele também não surgiu quando eu olhei pela 2a, 3a, e nem pela 10a vez. Pra falar bem a verdade, esse amor não “surgiu”; ele teve que ser construído ao longo do tempo, com muita ajuda e muita terapia. Consequentemente, eu não tinha vontade de cuidar dela, achava tudo chato e trabalhoso, e só fazia as coisas por obrigação. Eu ficava irritada por não conseguir fazer nada do que eu queria e ter que ficar 24h à disposição de uma criança que nem sequer sabia quem eu era. Eu não reconhecia o meu corpo, e ver o peito vazando leite me fazia questionar o tempo todo: “O que é que eu fui inventar? Ah se eu soubesse disso antes... e pior é que agora não tem volta.” Eu me aborrecia com meu marido, com a minha mãe e com meus amigos. Comecei a não querer ver mais ninguém, e pensei que a minha vida tinha acabado ali. Pra piorar, todos esses sentimentos e pensamentos geram muita vergonha e muita culpa, o que faz tudo tomar uma proporção ainda maior, como num efeito de “bola de neve”. Eu ficava me sentindo um monstro, uma pessoa terrível, uma mãe péssima e cruel. E não tinha coragem de falar pra ninguém as coisas que eu realmente pensava ou o que eu sentia, de “tão feias” que elas soavam pra mim mesma, e com medo de represálias.

Inconformada de estar triste no momento mais feliz da minha vida, fui buscar ajuda e tratamento. Fui melhorando gradativamente, mas nem tão rapidamente assim, e só quando minha filha tinha cerca de 1 ano e 2 meses, foi que eu consegui pensar em engravidar novamente, tamanho o medo de viver tudo aquilo outra vez. Na segunda gestação, prometi a mim mesma que não deixaria isso se repetir, e com ajuda profissional, eu re-escrevi a minha história. Hoje eu sou completamente louca por eles e não imagino o que seria de mim se não tivesse sido mãe!!! Mas como eu disse, não foi nada fácil. Ainda existe muito preconceito em relação à depressão, quem dirá quando ela acontece na gravidez e e no puerpério!

Assim como eu, muitas e muitas mulheres sofrem de depressão pós parto, e apesar de algumas terem um quadro um pouco mais leve, como uma melancolia, ansiedade, ou tristeza profundas, os repercussões na qualidade de vida da mulher e da família como um todo se mostram muito importantes. Posso arriscar dizer que, quase todos os dias atendo uma mulher que vive esse drama “em segredo”. E elas choram, aliviadas, quando percebem que alguém entendeu o que elas estão vivendo, que elas não são as únicas a passar por isso, e que existe um tratamento pra que elas possam, finalmente, desfrutar de todas as delícias e maravilhas do mundo da maternidade.

Então, se vc está gestante e percebeu que apresenta alguns dos fatores de risco citados acima, fique atenta, e acima de tudo, não tenha preconceito! Procure um médico se julgar necessário! O mais importante é estar bem, para poder cuidar do seu maior bem: seu filho. E se vc já teve bebê e passou (ou está passando), por uma experiência parecida, e nunca teve coragem de falar pra ninguém, bem vinda ao clube! Nós somos muitas! Kkkk. Não precisa se sentir um extraterrestre, e nem a pior das criaturas do mundo. Isso acontece nas melhoras famílias, rs. Mas não deixe de buscar ajuda.

Acreditem, tudo pode ser diferente, e a maternidade pode ser a melhor experiência da sua vida!!!


Dra. Priscila Pyrrho

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